Damos prosseguimento, agora, à segunda parte do relatório da Comissão de Milão, um grupo de sábios que estudou a médium Eusápia Paladino. Àqueles que não viram o primeiro post, deixamos aqui o link: Parte I.
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II – Fenômenos observados na escuridão
Os fenômenos observados na escuridão completa produziram-se enquanto estávamos todos sentados ao redor da mesa, fazendo a cadeia (pelo menos durante os primeiros minutos). As mãos e os pés da médium estavam seguros pelos seus dois vizinhos. Estando as coisas desse modo, verificaram-se logo depois os 65 fatos mais variados e singulares, que, sem dúvida, não obteríamos em plena luz, pois a escuridão aumentava evidentemente a facilidade dessas manifestações, que podem ser classificadas do seguinte modo:
1. Pancadas na mesa, sensivelmente mais fortes que as que se ouviam em plena luz; em baixo ou em cima dela, ruídos semelhantes ao de um murro ou de uma palmada.
2. Choque e pancadas nas cadeiras dos vizinhos da médium, por vezes bastante fortes para fazerem voltar a cadeira com a pessoa. Algumas vezes, quando esta pessoa se levantava, a cadeira era retirada.
3. Transporte, para cima da mesa, de objetos diversos, tais como cadeiras, vestuários e outras coisas, distanciadas de vários metros e pesando vários quilos.
4. Transporte, no ar, de objetos diversos (instrumentos de música, por exemplo); percussões e sons produzidos por esses objetos.
5. Transporte, para cima da mesa, da médium com a cadeira em que se achava sentada.
6. Aparição de pontos fosforescentes de muito pouca duração (uma fração de segundo) e de claridades, notadamente de discos luminosos, que muitas vezes se desdobravam, de duração igualmente muito curta.
7. Ruído de duas mãos que se batiam no ar, uma na outra.
8. Sopros sensíveis, como uma ligeira aragem, limitada a um pequeno espaço.
9. Toques produzidos por mão misteriosa, ora nas partes vestidas do nosso corpo, ora nas partes descobertas (rosto e mãos), e neste último caso experimentava-se exatamente a sensação de contato e de calor que produz a mão humana. Por vezes percebem-se realmente esse toques, com um ruído correspondente.
10.Visão de uma ou duas mãos projetadas num papel fosforescente ou uma janela fracamente iluminada.
11.Diversos trabalhos efetuados por essas mãos: nós feitos e desfeitos, traços de lápis (conforme toda a aparência) deixados sobre uma folha de papel ou outro lugar. Impressões dessas mãos numa folha de papel enegrecida.
12.Contato das nossas mãos com uma figura misteriosa, que não é certamente a da médium. Todos os que negam a possibilidade dos fenômenos mediúnicos tentam explicar esse fatos supondo que a médium tem a faculdade (declarada impossível pelo Professor Richet) de ver na escuridão completa onde se faziam as experiências, e que por hábil artifício, agitando-se de mil maneiras na escuridão, acaba por fazer segurar uma das mãos pelos seus dois vizinhos, tornando a outra livre, para produzir os toques. Aqueles dentre nós que tiveram ocasião de vigiar as mãos de Eusápia são obrigados a confessar que esta não se prestava certamente a facilitar a sua vigilância. No momento em que se ia produzir algum fenômeno importante, ela começava a agitar-se, torcendo-se e tentando libertar as mãos, sobretudo a direita, como de um contato penoso. Para tornar a vigilância contínua, os seus vizinhos eram obrigados a seguir todos os movimentos da mão fugitiva, o que ocasionava perder-se, por limitados instantes, o seu contato, exatamente na ocasião em que mais se desejava tê-la presa. Nem sempre era fácil saber se se segurava a mão direita ou a esquerda da médium. Por essa razão, muita das manifestações, observadas na escuridão, foram consideradas como de valor demonstrativo insuficiente, posto que, em realidade, provável. Assim, não mencionaremos estas, expondo somente alguns casos sobre os quais não se pode ter nenhuma dúvida, seja por causa da certeza do exame feito, seja pela impossibilidade manifesta de terem eles sido obra da médium.
a) Transporte de diferentes objetos enquanto as mãos e os pés da médium estavam amarrados aos dos seus vizinhos:
Para nos certificarmos de que não éramos vítimas de uma ilusão, ligamos as mãos da médium às dos seus dois vizinhos, por meio de cordel de três milímetros de diâmetro, de maneira que os movimentos das quatro mãos se verificassem reciprocamente. A ligação foi feita da maneira seguinte: ao redor de cada punho da médium deram-se três voltas bem justas com o cordel, apertadas a ponto de doer, e em seguida deu-se duas vezes um nó simples. Isso feito, foi colocada uma campainha sobre uma cadeira, à direita da médium. Estabeleceu-se a cadeia e as mãos e os pés da médium foram, além disso, seguros como de costume. Fez-se escuridão e exprimimos o desejo de que a campainha tocasse sem demora. Imediatamente ouvimos a cadeira virar, descrever uma curva no soalho, aproximar-se da mesa e logo se colocar sobre ela. A campainha tocou; depois foi atirada sobre a mesa. Tendo-se feito bruscamente luz, verificou-se que os nós estavam perfeitos. É claro que o transporte da cadeira não foi produzido pelas mãos da médium, durante essa experiência, que durou, no máximo, 10 minutos.
b) Impressão de dedos obtidos num papel enfumaçado: Para termos certeza de que realmente estava em jogo uma mão humana, fixamos na mesa, do lado oposto ao da médium, uma folha de papel enegrecida com fumaça, exprimindo o desejo de que a mão deixasse nele uma impressão, que a mão da médium ficasse limpa e que o preto da fumaça fosse transportado para uma das nossas mãos. As mãos da médium estavam seguras pelas dos Srs. Schiaparelli e Du Prel. Feita a cadeia e a escuridão, ouvimos logo mão estranha bater fracamente na mesa e, na mesma ocasião, o Sr. Du Prel anunciar 68 que a sua mão esquerda, que segurava a direita do Sr. Fínzi, sentia dedos que a esfregavam. Feita a luz, achamos no papel várias impressões de dedos e as costas da mão do Sr. Du Prel enegrecidas: as mãos da médium estavam perfeitamente limpas. Essa experiência foi repetida três vezes, insistindo-se para se ter uma impressão completa; numa segunda folha obtiveram-se cinco dedos e numa terceira a impressão de uma mão esquerda quase inteira. Depois disso, as costas da mão do Sr. Du Prel estavam completamente enegrecidas, permanecendo as mãos da médium perfeitamente limpas.
c) Aparição de mãos sobre um fundo ligeiramente iluminado: Colocamos na mesa um cartão embebido de substância fosforescente (sulfureto de cálcio) e outros sobre cadeiras, em diferentes pontos da sala. Nessas condições, vimos muito bem um perfil de mão que descansava sobre o cartão da mesa e sobre o fundo formado pelos outros cartões; vimos a sombra da mão passar e perpassar ao redor de nós. Na noite de 21 de setembro, um de nós viu várias vezes, não uma, porém duas mãos ao mesmo tempo projetarem-se sobre a fraca luz de uma janela fechada somente com caixilhos (fora era noite, mas a escuridão não era absoluta), as mãos agitavam-se com rapidez, não tanto, todavia, que não pudéssemos distinguir nitidamente o perfil. Eram completamente opacas e projetavam-se sobre a janela, em sombras absolutamente negras. Não foi possível ajuizar-se sobre os braços, aos quais estavam ligadas, porque somente pequena parte desses braços, junta ao punho, se interpunha à fraca claridade da janela, no lugar em que era possível observá- la. Esses fenômenos de aparição simultânea de duas mãos são muito significativos, porque não podem ser explicados pela hipótese de fraude da médium, que não teria conseguido, de nenhum modo, tornar livre senão uma das suas, graças à vigilância dos seus vizinhos. A mesma conclusão se aplica ao bater de duas mãos, uma contra outra, o que foi ouvido várias vezes no ar, durante o curso das nossas experiências.
d) Elevação da médium sobre a mesa: Colocamos entre os fatos mais importantes e mais significativos essa elevação, que foi efetuada duas vezes, em 23 de setembro e 3 de outubro: a médium, que estava sentada à cabeceira da mesa, soltando fortes gemidos, foi levantada com a cadeira e colocada com ela sobre a mesa, sentada na mesma posição, tendo sempre as mãos seguras e acompanhadas pelos seus vizinhos. Na noite de 28 de setembro, a mesma médium, enquanto as suas mãos estavam seguras pelos Srs. Richet e Lombroso, queixava-se de mãos que a seguravam por baixo dos braços. Depois, em transe, disse com voz mudada, muito comum nesse estado: “Agora vou levar a médium para cima da mesa”. Ao cabo de 2 ou 3 segundos, a cadeira, com a médium que nela se achava sentada, foi, não atirada, mas levantada sem precaução e colocada em cima da mesa, enquanto os Srs. Richet e Lombroso asseveravam não ter ajudado em nada essa ascensão com os seus esforços. Depois de ter falado, sempre em estado de transe, a médium anunciou a sua descida. Nessa ocasião, o Sr. Fínzi substituía o Sr. Lombroso. A médium foi depositada no chão com inteira segurança e precisão, e os Srs. Richet e Fínzi acompanhavam, sem a ajudar em nada, os movimentos das mãos e do corpo e interrogavam-se a cada instante sobre a posição das mãos. Além disso, durante a descida, ambos sentiram, por vezes repetidas, mão estranha tocá-los levemente na cabeça. Na noite de 3 de outubro, o mesmo fenômeno se repetiu, em circunstâncias bastante semelhantes, estando os Srs. Du Prel e Fínzi colocados ao lado da médium.
e) Contatos: Alguns merecem notados, particularmente, por causa de uma circunstância capaz de fornecer alguma noção interessante sobre 70 a sua possível origem; e, antes de tudo, é preciso notar os contatos que foram sentidos pelas pessoas colocadas fora do alcance das mãos da médium. Assim, a 6 de outubro, o Sr. Gerosa, que se achava à distância de cerca de um metro da médium, tendo elevado a mão para que ela fosse tocada, sentiu várias vezes uma outra que batia na sua para abaixá-la e, como ele persistia, foi tocado com uma trombeta, que pouco antes tinha produzido sons no ar. Depois, é preciso notar os contatos que constituem operações delicadas, que não podem ser executadas na escuridão com a precisão que lhes temos notado. Duas vezes (16 e 21 de setembro), os óculos do Sr. Schiaparelli foram tirados e colocados sobre a mesa, diante de outra pessoa. Esses óculos estavam fixados às orelhas por meio de duas molas e é preciso certa atenção para os tirar, mesmo para quem opera em plena claridade. Foram, no entanto, tirados na escuridão completa, com tanta delicadeza e prontidão, que o ilustre sábio só percebeu quando não mais sentiu o contato habitual deles sobre o nariz, fontes e orelhas e foi necessário apalpar-se para ter certeza da realidade do fato. Efeitos análogos resultaram de muitos outros contatos, executados com excessiva delicadeza, por exemplo, quando um dos assistentes sentiu acariciarem-lhe os cabelos e a barba. Em todas as inumeráveis manobras executadas por mãos misteriosas, jamais houve uma negligência ou um choque, o que é ordinariamente inevitável com quem opera na escuridão.
f) Contatos com uma figura humana: Tendo um de nós manifestado o desejo de ser beijado, sentiu diante da própria boca o estalido rápido de um beijo, mas não acompanhado de contato de lábios: isso se produziu duas vezes (21 de setembro e 1° de outubro). Em três ocasiões diferentes aconteceu a um dos assistentes pôr a mão em uma figura humana que tinha cabelos e barba. O contato da pele era absolutamente o do rosto de um homem vivo, os cabelos eram muito mais ásperos e arrepiados do que os da médium e a barba, ao contrário, parecia muito fina (1°, 5 e 6 de outubro). 71 g) Experiências de Zöellner sobre a penetração de um sólido através de outro sólido: Ensaiamos sucessivamente três das experiências de Zöellner, a saber: 1°- O entrecruzamento de dois anéis sólidos (de madeira ou papelão), antes separados; 2°- A formação de um nó simples numa corda sem fim; 3°- A penetração de um objeto sólido numa caixa fechada, estando a chave guardada. Nenhuma dessas tentativas foi bem sucedida, dando-se o mesmo com outra experiência que teria sido não menos convincente – a do molde da mão misteriosa na parafina derretida.
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Disponibilizamos, aqui, a segunda parte do relatório, nos próximos posts, continuaremos com a parte III seguida das conclusões. Um grande abraço, a todos.
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