Olá amigos !
Transcrevermos aqui uma monografia de Ernesto Bozzano, onde ele, eminente pesquisador dos fenômenos espíritas, nos brinda com esse emocionante registro histórico que consta nos anais da ciência da alma - O Caso de Jonathan Koons.
O Texto é longo, mas extremamente interessante !
O caso em questão ocorreu pouco depois dos fenômenos de Hydesville. Os fenômenos relatados ocorreram cerca de 20 anos antes de William Crookes constatar os mesmos fenômenos com o auxílio de vários médiuns, sendo o principal Daniel Dunglas Home.
***
Por Ernesto Bozzano
Na vida moderna, tão febril e agitada e na qual tudo muda, se
transforma, progride ou degenera sem cessar, o tempo faz-nos eventualmente
voltar o pensamento ao passado, para relembrar, com sentimentos de
reconhecimento, os nomes de tantos obscuros trabalhadores da inteligência que
contribuíram, coletivamente, para criar este meio ambiente de cultura e de
bem-estar que nos torna tão orgulhosos. Estas reflexões melancólicas, embora
expressas em termos gerais, podem ser atribuídas a todos os ramos do saber
humano, mas limitar-me-ei aqui a aplicá-las em relação ao movimento
espiritualista atual.
Neste domínio, com efeito, bem poucos pesquisadores se dão
conta da necessidade de remontar, de tempos em tempos, às origens, comparando
os resultados de hoje com aqueles a que chegaram os primeiros investigadores. E
essa negligência não é apenas lastimável quanto aos que muito trabalharam e
sofreram pela causa da Verdade; ela é mais deplorável ainda porque prejudica a
evolução normal das doutrinas metapsíquicas.
Com efeito, nota-se muitas vezes que algumas das conclusões
mais importantes a que chegamos em nossos dias e que parecem o resultado do
nosso saber evoluído, já tinham sido alcançadas por nossos bravos pioneiros de
há setenta anos.[i]
Da mesma forma, encontram-se freqüentemente, nas atas de suas experiências,
tentativas cheias de interesse e de originalidade dignas realmente de serem
tiradas do esquecimento para que se possa renovar-lhes a aplicação.
Pensei então em fazer uma exposição crítica das pesquisas
experimentais executadas em alguns dos numerosos “círculos” que se sucederam
nos primeiros dez anos do movimento espiritualista, começando pelo “círculo” de
Jonathan Koons, um homem que recebeu a paga do seu devotamento admirável ao
serviço da nova Ciência da Alma com a sua própria ruína moral e financeira, o
que constitui o destino de tantos precursores.
Creio útil indicar que as citações e os resumos das atas que
aparecem neste trabalho foram tirados, na maior parte, da interessante obra
histórica de Emma Hardinge-Britten Modern
American Spiritualism (1870), de um ano muito raro da revista The Spiritual Telegraph (1853) e, em
pequena parte, também do livro do prof. Robert Hare, Experimental Investigations (1855), bem como do primeiro volume da
obra de Frank Podmore Modern Spiritualism
(1902).
Jonathan Koons |
Jonathan Koons era proprietário de uma modesta mas próspera
granja, situada num distrito montanhoso do Condado de Athens, no Ohio, a 72
milhas de Columbus, a capital do Estado. Era pai de oito filhos e, até o começo
do ano de 1852, a sua tranqüila existência decorrera absorvido inteiramente
pelos seus deveres de pai e pelos cuidados da sua granja. No ponto de vista de
religião, a sua mentalidade, essencialmente submetida à razão, se tinha
revoltado cedo contra a imposição, pela fé de certos dogmas ultrapassados e
absurdos e, oscilando de uma revolta à outra, caíra finalmente em um ateísmo
absoluto.
Entrementes, as famosas manifestações mediúnicas de
Hydesville se tinham produzido graças à mediunidade das irmãs Fox e várias
famílias dos arredores haviam organizado “círculos de experimentação” com o fim
de obter manifestações análogas. Uma família amiga de Koons havia tentado, por
sua vez, a empresa, com bons resultados, e, certa noite, Koons deixou-se
arrastar a uma dessas sessões. As manifestações às quais assistiu não foram de
grande importância, mas ele voltou a casa com a convicção de que as batidas (raps), de natureza inteligente, que
ouvira não eram obra da ingênua mocinha que desempenhava a função de médium.
Convidado para ir a outros “círculos”, ficou surpreso ao
ouvir repetir por todas as personalidades mediúnicas [ii]
que ele, Koons, possuía faculdades mediúnicas. Certa vez ouviu mesmo declarar,
sem rebuços, que ele era o médium mais poderoso de sua época, que um dos seus
filhos também era médium e que todos os membros da sua família eram sensitivos.
Constituiriam excelentes elementos para as manifestações espíritas. O bom do
granjeiro acolheu a espantosa notícia com uma explosão de riso, mas se deixou
convencer a tentar a prova de sua mediunidade, formando um grupo familiar. A
experiência teve um êxito de modo a autorizar toda a esperança, e mais do que
isso, de acordo com as declarações das entidades comunicantes, verificou-se que
um dos filhos de Koons, chamado Nahum, de 18 anos de idade, caía em transe,
escrevia automaticamente e falava por inspiração.
Eis em que termos se exprimiu o próprio Jonathan Koons a
respeito das suas primeiras experiências:
“Obtivemos as manifestações mais notáveis e de maior
força que se produziram em todo o distrito, apesar do que, no que me dizia
respeito, não chegava a convencer-me de que essas manifestações eram obras de
“espíritos desencarnados”, continuando a atribuí-las à “eletricidade” e à “biologia”.
Não podia adaptar-me à idéia da sobrevivência da alma. Reconhecia que certas
manifestações eram maravilhosas, admitia não poder explicá-las, concordava em
que entre elas havia algumas muito belas e elevadas, mas permanecia, assim
mesmo, atormentado pelas dúvidas e seguia céptico, ao passo que a minha família
e os meus amigos se pasmavam, ao contrário, de admiração, diante das
comunicações angélicas que havíamos obtido.
Certo dia, finalmente, por meio da mediunidade de meu filho,
as personalidades mediúnicas me disseram para construir, no jardim, um quarto
de madeira, destinado exclusivamente às experiências, assim como uma mesa
especial, tudo conforme planos e desenhos que me forneceriam. Depois disso eu
poderia obter todas as provas que desejava, de modo a convencer centenas de
pessoas, cépticas como eu, a respeito da existência e da sobrevivência da alma.
Decidido a ir ao fundo do mistério, pus-me à obra e construí,
no jardim, uma sólida cabana de madeira, assim como a mesa, seguindo
escrupulosamente os planos fornecidos. Depois disso, sempre conforme as
instruções recebidas, coloquei papel e lápis sobre a mesa; fechei à chave o
quarto, cuja porta selei, depois do que me pus em guarda diante dela. Decorrido
o tempo fixado, abri-a e entrei, quando então achei as folhas de papel cheias
de uma longa mensagem a mim dirigida e que continha ensinos, conselhos,
promessas encorajadoras, censuras amáveis ao meu cepticismo e ainda provas
íntimas e eloqüentes que demonstravam que essa mensagem provinha de uma
inteligência espiritual sábia e elevada.
Prossegui, durante várias semanas, nessas experiências,
reunindo um número considerável de comunicações obtidas no silêncio e o
mistério de meu “quarto espírita”, sem a menor possibilidade de qualquer
intervenção humana. Não é, pois, de surpreender que o meu inveterado cepticismo
desaparecesse pouco a pouco e que as minhas perplexidades houvessem acabado por
se transformar na certeza inabalável de que me achava nas mãos de uma falange
de entidades espirituais sábias, poderosas e elevadas. Certo dia, os “invisíveis”
ditaram uma lista de instrumentos de música e outros artigos que eu deveria
procurar para colocar no quarto, de acordo com as instruções que me seriam
dadas...”
Jonathan Koons e sua esposa, Abigail |
É preciso acrescentar que o fenômeno da “escrita
direta”, do qual se pôde ler a descrição, tornou-se, em seguida, o mais habitual
nesse círculo de experimentadores e que a maior parte do tempo, quando ele se
produzia, todas as pessoas podiam observar a mão espiritual, fosforescente, que
grafava a mensagem com prodigiosa rapidez.
Adicionarei, para a história, que, nos anais das
manifestações mediúnicas, era a segunda vez que se obtinha o fenômeno da
“escrita direta”. Esse fenômeno já se tinha verificado pela primeira vez, em
plena luz, em 1850, na casa do Hon. James F. Simmons, Senador dos Estados
Unidos da América para o distrito de Rhode Island.
Antes de prosseguir na exposição das outras manifestações obtidas
no “círculo” de Koons, preciso dizer uma palavra sobre a natureza das
personalidades mediúnicas graças às quais elas se produziram, explicações
fornecidas por elas próprias relativamente às condições em que produziam os
fenômenos e as posteriores instruções dadas para facilitar a sua realização.
Os “espíritos-guias”, que se manifestavam nas experiências de
Koons diziam ter vivido milhares de anos antes da época assinalada na história
pela lenda de Adão e Eva; faziam-se chamar pelo nome genérico de Reis (Kings), porque se achavam na direção de
diversas hierarquias espirituais. Acrescentaram que haviam recebido a missão de
encaminhar os homens para a demonstração experimental da existência e da
sobrevivência da alma. Disseram ainda que, levando em conta a falta de preparo
espiritual dos homens, não viam outro meio para atingir o seu fim senão o de
ferir antes a sua imaginação por meio de fenômenos psíquicos diversos e
potentes e que, com esse propósito, haviam reunido falanges de espíritos
inferiores, muito materializados e atraídos pelo mundo dos vivos, porque só
eles estavam em condições de manipular os fluidos que se desprendiam dos
médiuns, empregando-os na produção dos fenômenos, sob a direção e a vigilância
de espíritos superiores. Observarei aqui que o chefe dessas falanges de
espíritos inferiores disse ter vivido na Inglaterra no tempo de Carlos II, de
ter sido um famoso corsário de sobrenome Morgan e falecido como cavaleiro da
Coroa Inglesa e governador da Jamaica. Nas experiências de Koons, tomara o nome
de “John King”. Teria sido o mesmo que se manifestou mais tarde pela médium
Srta. Florence Cook, declarando-se pai de “Katie King”.
Os “espíritos-guias” forneceram a Koons, além disso, as instruções
necessárias para a construção de uma “máquina espírita”, com o fim de detectar
e localizar a aura magnética dos médiuns e assistentes, aura indispensável para
a produção das manifestações espíritas. É lastimável que os historiadores do
Espiritismo tenham todos negligenciado de fornecer uma descrição detalhada do
aparelho em questão, descrição que apareceu em uma revista da época, The Spiritual Clarion. Seria, com
efeito, muito interessante se se possuíssem indicações suficientes a respeito.
A sua reconstrução seria provavelmente eficaz para a produção de uma grande
parte dos fenômenos mediúnicos, pois que se tem provas indubitáveis de que o
aparelho se mostrou muito eficaz nas experiências de Koons. Sabe-se apenas que
era composto de elementos de cobre e de zinco, dispostos de um modo assaz complicado.
De acordo com as diretivas dos “espíritos-guias”, essa “bateria eletromagnética”
foi colocada no centro de uma grande mesa de madeira, sobre a qual eram
dispostos os instrumentos de música e todos os objetos a serem utilizados nas
manifestações.
Registremos também que os “espíritos-guias” haviam fornecido
a Koons uma receita para preparar uma solução fosforescente a ser colocada
sobre a “mesa mediúnica” a fim de que as mãos materializadas pudessem
mergulhar-se nela, tornando-se assim visíveis em todos os seus movimentos.
Jonathan Koons e seu filho, Nahum |
Antes de começar as suas novas manifestações objetivas, os
“espíritos-guias” tiveram o cuidado de avisar que elas não tinham nenhum valor
no ponto de vista da missão espiritual que lhes havia sido confiada, exceto
como uma introdução necessária à missão mesma, que elas não estavam destinadas
senão a impressionar os homens de maneira a abalar-lhes o cepticismo e a
levá-los a refletir sobre os mistérios do ser. Em seguida, o chefe supremo dos
“espíritos-guias” ditou, por meio da “escrita direta” uma longa mensagem, de
elevado conteúdo, ao “círculo”, mensagem de que não me é possível reproduzir
senão o começo e o fim. Ei-los:
“O espírito deste ser espiritual que se manifesta na
Terra sob o nome simbólico de “King”, Servidor e Discípulo de Deus, deseja
apresentar-se a Jonathan Koons e a todos. Eu vos escolhi para a realização dos
meus fins por causa das faculdades mediúnicas, magnéticas, clarividentes que
possuía e graças às quais os espíritos poderão exprimir, de viva voz ou por
escrito, os seus pensamentos, sem expor muito a vê-los deformados pelas idéias
preconcebidas dos médiuns ou mal transmitidas por causa de sua ignorância.
Viemos ao vosso meio em conseqüência da necessidade urgente de novas verdades
espirituais que hoje se manifestam entre os vivos. Não ignoramos que a nossa
obra é repelida e condenada por um grande número de pessoas como uma armadilha
de Satanás, desse Satanás que fazem questão de abominar, embora, na verdade,
dele se sirvam constantemente para crucificar a Verdade, repudiando tudo o que
contrasta com o seu pobre orgulho e os seus vãos preconceitos. Acreditais que
eu me ufano por trazer a minha palavra aos vivos e ser ouvido? De modo algum,
eu vos garanto e, no entanto, tenho a missão de tentar a prova, porque, se uma
única ovelha desgarrada ouvir a minha voz e se dirigir ao redil da Verdade
Espiritual, eu voltarei ao Pai Celestial que me enviou e lhe direi: “Minha
missão está cumprida”.
John King Materializado |
Por vontade expressa das personalidades mediúnicas, as
sessões se realizaram em condições de rigoroso controle e, com esse fim, haviam
ditado a disposição em que deveriam ser colocados os móveis, os objetos, os
médiuns e os assistentes. Havia primeiramente uma grande mesa quadrada, no meio
da qual era colocado o aparelho espírita; em torno dele ficavam os instrumentos
de música e outros objetos a serem utilizados nas sessões. Vinha em seguida o
tripé mediúnico, que era redondo e tinha um diâmetro de quatro pés. Dois
médiuns e quatro experimentadores sentavam-se em semicírculo ao redor desse
tripé, deixando livre o lado em que ficava a outra mesa. Finalmente,
dispunham-se os outros assistentes em filas cerradas. A Sra. Emma Hardinge, o
principal historiador desses fatos, aos quais assistiu, observa o seguinte:
“O quarto estava sempre cheio de gente, de modo que
os assistentes cercavam os médiuns de todos os lados; por esse motivo o mínimo
movimento de qualquer um deles seria logo percebido e qualquer esforço violento
dos seus membros teria sido absolutamente impossível.”
Veremos, aliás, que a melhor prova em favor da
autenticidade dos fenômenos é fornecida pela maneira como esses se realizavam.
Os principais instrumentos de música, colocados sobre a mesa
grande, consistiam em dois tambores, uma harpa, uma guitarra, um violino, um
acordeom, um pandeiro, um triângulo, uma trombeta e várias campainhas.
As manifestações podiam ser classificadas em duas categorias
distintas: de um lado os fenômenos físicos e inteligentes, de uma força, de uma
potência, de uma violência quase terrificantes; de outro lado os fenômenos
físicos e inteligentes de natureza delicada, elevada, espiritual.
As sessões começavam quase sempre por batidas e ruídos estranhos,
atordoantes, que podiam ser ouvidos em um raio de uma milha. Seguia-se uma
alvorada formidável, tocada pelos tambores; em seguida fazia-se ouvir um ruído
estridente, característico, produzido pela carga do “aparelho espirítico”. Uma
vez terminada a carga, faziam-se provas de força, sacudindo, de modo violento,
a forte viga de madeira da cabana, que oscilava ou estalava como se movida por
um tremor de terra.
Era então a vez dos concertos musicais. Bastava que o médium
Koons desse o sinal de abertura, tocando no seu violino. Logo todos os
instrumentos entravam em ação, acompanhando a melodia que Koons havia entoado,
guardando o ritmo, mas excedendo na potencialidade sonora das notas, levadas ao
máximo que um músico humano pode atingir. Em outras circunstâncias, ao contrário,
o concerto mediúnico decorria em melodias “celestiais”, desenvolvendo uma
delicadeza de sentimentos que emocionava e entusiasmava o auditório. Por vezes,
enfim, uma “voz espiritual” pedia o mais absoluto silêncio e ouviam-se então
coros de vozes angelicais que pareciam chegar de remotas paragens, causando nas
almas uma sensação incomum e profunda de misticismo e de mistério. Em seguida,
esses coros pareciam aproximar-se lentamente até penetrar e ressoar no meio da
sala. Seu efeito sobre o auditório era prodigioso e inesquecível, estando os
seus narradores acordes em declarar que nada poderia dar uma idéia deles às
pessoas que não os tinham ouvido.
Muitas vezes, quando os coros angelicais se faziam ouvir, o
ar palpitava de pequenas chamas que volitavam de um lado para o outro com a
agilidade e a volubilidade caprichosa dos insetos, mas com isto de especial: os
seus movimentos seguiam o ritmo da música. Algumas vezes viam-se aparecer, no
meio das chamas, mãos materializadas que tinham formas e dimensões diferentes e
que deixavam cair sobre os assistentes folhas de papel pintadas com a solução
fosforescente preparada por Koons. Essas mãos desciam, algum tempo depois, no
meio dos assistentes que, graças ao papel fosforescente, estavam em condições
de observá-las. Elas se deixavam apalpar livremente pelos experimentadores,
entre os quais se achava às vezes o céptico exagerado que procurava segurar
alguma delas, decidido a não deixar escapá-la, caso em que a mão se libertava
prontamente, dissolvendo-se em vapor e se reconstituindo logo depois. Os que
tinham contato com as mãos materializadas afirmavam, em termos concordantes,
que elas pareciam em tudo idênticas às mãos humanas, menos por esta distinção:
eram frias como as de um cadáver.
A propósito do fenômeno interessante das mãos que se desfaziam
em vapor para se libertarem do aperto de certos experimentadores, importa notar
que era a primeira vez que esse fenômeno
era obtido nos grupos espíritas. O mesmo fenômeno ocorreu, a seguir,
repetidamente com o médium D. D. Home e em algumas circunstâncias com Eusápia
Palladino.
Um outro fenômeno teoricamente muito importante era o do
diálogo estabelecido entre os experimentadores e seus mortos, pela “voz
direta”. A esse respeito observa a Sra. Emma Hardinge o seguinte:
“Deve-se notar que vários visitantes que haviam
desejado conservar-se inteiramente incógnitos foram chamados pelos seus nomes
pelas personalidades mediúnicas. Nessas circunstâncias, os visitantes em
questão, com grande surpresa afirmavam ter perfeitamente reconhecido o timbre
de voz e o acento pessoal do desencarnado que se dizia presente e que lhes
fornecia indicações absolutamente verídicas e íntimas relativamente às suas
existências terrenas. São essas provas, de natureza irrefutável, que servirão
para convencer centenas de pessoas a respeito da presença real dos espíritos
dos mortos.”
Para a história, importa observar que o fenômeno da
“voz direta” foi produzido, no círculo de Koons, pela primeira vez desde o início do movimento espírita, o que faz
com que essa série de experiências marque uma data importante nos anais do
Espiritismo. Bem entendido, o fenômeno não era inteiramente novo, pois
encontram-se fatos dessa natureza em todas as histórias e tradições dos povos a
partir da mais remota antiguidade. Sabe-se também que ele sempre se verificou
espontaneamente, freqüentes vezes nos “fenômenos de assombração”. Entre os
povos selvagens, têm sido assinalados exemplos esplêndidos de “voz direta”
obtida experimentalmente. O que constituiu uma real novidade foi o emprego de
um porta-voz para reforçar o volume das vozes dos espíritos, artifício que foi
sugerido a Koons pelas personalidades mediúnicas.
No mesmo círculo foram também obtidas mensagens por “escrita
direta”, a pedido dos experimentadores, casos em que, como já disse, podia
perceber-se a mão fosforescente que escrevia. Eis um exemplo, escolhido ao
acaso, entre as centenas que foram publicados. No relatório enviado à revista The Age of Progress pelo Sr. Stephen
Dudley lê-se o seguinte episódio:
“Solicitei ao Sr. Koons pedisse aos espíritos para
escrever uma mensagem para mim e logo um deles se apossou do papel e do lápis
que eu havia depositado em cima da mesa. Devo dizer que me provera de papel de
impressão, sem dimensões exatas e sem pautas, isto é, de papel diferente do que
se pode achar nesse distrito afastado dos grandes centros ou, mais precisamente,
que não se pode encontrar a não ser nas editoras. Havia também pensado em me
prover de um lápis especial, que me fora fornecido pela Casa Flesheim, de
Buffalo. O espírito colocou o papel bem defronte de mim e logo apareceu uma mão
luminosa, indubitavelmente humana, que apanhou o lápis e começou a escrever com
uma rapidez prodigiosa, que jamais a mão de um vivo poderia igualar. O papel, a
mão e o lápis estavam tão perto de mim que eu poderia tocar neles sem sair do
lugar, pelo que pude observar tudo de uma maneira completa e precisa. Meu
vizinho estava de tal modo atento na observação do fenômeno que, em dado
momento, aproximou mais sua cabeça. Então a mão que escrevia, com um movimento
rápido, lhe deu com o lápis uma pequena pancada no nariz, provocando no curioso
um vivo sobressalto de surpresa e de medo, em vista do que encolheu-se
rapidamente. Alguém exprimiu o desejo de contemplar a mão mais de perto e essa
depositou o lápis, adiantou-se, abrindo, fechando e movimentando os dedos, a
fim de mostrar a flexibilidade das suas juntas e, ao mesmo tempo, a amabilidade
do seu possuidor. Certa senhora, colocada um pouco longe, se queixava de não
ver bem e a mão apanhou o papel, levou-o para defronte dela e escreveu várias
linhas, para retornar em seguida ao seu lugar. Quando as duas páginas de papel
ficaram cobertas de escrita, a mão dobrou-a com cuidado e entregou-ma com o lápis.
Certifiquei-me de que o papel e o lápis eram bem os mesmo que eu tinha
depositado sobre a mesa. Finalmente, a mão se mostrou sucessivamente a todos os
assistentes, concedendo-lhes um aperto cordial. Um dos assistentes evitou,
entretanto, tocá-la, certamente por timidez ou medo. Observamos todos que essa
mão materializada era tão sólida quanto a de um vivo, porém mortalmente
fria...”
Nahum Koons em 1921 |
Com isso termino a enumeração dos principais fenômenos
que se produziam na “câmara espírita” de Jonathan Koons. Com efeito, seria
inútil estender-me na descrição dos outros fenômenos menores, geralmente
conhecidos, tais como os golpes desferidos em todos os cantos do quarto, os
sopros de vento frio, os deslocamentos, as levitações de objetos, etc.
Pouca coisa restou das numerosas mensagens morais, didáticas,
científicas e filosóficas redigidas por meio da “escrita direta”, pelo chefe
supremo “King” e os outros espíritos que o assistiam. Os consulentes, com
efeito, levaram consigo as longas mensagens obtidas. O Dr. J. Everett reuniu um
certo número delas que publicou em um opúsculo do qual falaremos mais adiante.
Jonathan Koons publicou, por sua vez, um resumo geral dos ensinamentos nelas
contidos, que se revestem de um real interesse porque concordam, admiravelmente,
com as conclusões às quais chegou-se hoje, relativamente à solução mais
racional de alguns enigmas do mediunismo. No que se refere às condições
necessárias para que os espíritos possam comunicar-se com os vivos, são muito
instrutivas as observações seguintes. Escreve Koons:
“Numa longa comunicação dada por meio da “escrita direta”
na “câmara espírita”, onde não se achava ninguém, lê-se que os espíritos, para
se comunicarem com os vivos, empregam dois elementos principais. O primeiro é
um elemento eletromagnético constituindo o substrato do “corpo etéreo” dos
espíritos; o outro é a “aura física”, se desprendendo dos organismos dos
médiuns e dos assistentes ou que é subtraída a substâncias inanimadas, “aura”
que corresponde ao que se chama de “força vital”. A combinação dos dois
elementos em apreço dá lugar a um terceiro elemento eminentemente ativo, embora
passível de sofrer a influência do meio e sobretudo das emanações dos
organismos humanos. Quando as condições permitem que o elemento espiritual
eletromagnético seja o mais forte, então os espíritos se acham em condições de
triunfar sobre as leis de coesão e gravitação; podem assim dissolver e
reconstituir toda substância com uma rapidez enorme ou levantar no ar,
transportar objetos mais ou menos pesados, tocar instrumentos de música e assim
por diante, tudo isso graças à força que se acumulou com a ajuda da “bateria
eletromagnética”. Do mesmo modo saturando-se desse elemento, os espíritos ficam
em condições de entrar em relação com os seres vivos, empregando o lápis e a
pena, escrevendo mensagens e desenhando. É ainda assim que eles produzem golpes
e ruídos, fenômenos vibratórios e ondulatórios, que realizam manifestações
luminosas ou que condensam as vibrações sonoras de maneira a reproduzir a voz
humana, falando e cantando.”
No que concerne à parte científica e filosófica dos
seus ensinos, direi que os “espíritos-guias” não cessam de exortar os experimentadores
a submeter ao controle da razão as mensagens mediúnicas que obtêm. Explicam,
com efeito, que é muito difícil para um espírito transmitir, aos vivos sem
nenhuma alteração, o seu pensamento, porque os órgãos cerebrais de que se
servem não estão sempre em condições de assimilar as idéias espirituais que
lhes são transmitidas, seja por causa da cultura geral deficiente dos médiuns
ou dos preconceitos enraizados na sua mente. Além disso, os “espíritos-guias”
insistem no fato de que a linguagem humana é um meio muito imperfeito para a
transmissão de concepções espirituais... Acrescentam que os espíritos, situados
há muito tempo nas Esferas, tendo adquirido o hábito de transmitir os seus
pensamentos com o auxílio de meios bem mais perfeitos que a palavra, perdem o
hábito de se exprimir pela linguagem humana. Observam, finalmente, que o
magnetismo dos médiuns limita e deforma os pensamentos transmitidos pelos
espíritos, mesmo no caso da “escrita direta”, isso embora, aparentemente, toda
participação das faculdades intelectuais dos médiuns, nessa operação, pareça
estar excluída. Com efeito, a mão materializada, ainda que separada do
organismo do médium, lhe está ligada por um cordão fluídico invisível e, salvo
em raras circunstâncias, obedece à sua vontade. Quer dizer que a personalidade
sonambúlica do médium é ainda a que registra e traduz, na linguagem humana, os
pensamentos dos espíritos, transmitindo-a à mão que escreve.
Em resumo: os “espíritos-guias” afirmavam que as mensagens
espirituais transmitidas aos vivos têm muito da mentalidade do médium, às vezes
pela forma e às vezes pela substância, como as feições de uma forma materializada
se assemelham quase sempre às do médium (esta última analogia é minha).
Examinando esses ensinamentos dos espíritos, ditados no decurso
de 1852 a 1856, é curioso observar que a pesquisa moderna não conseguiu
ultrapassá-los e ir mais longe. Nada de melhor foi obtido e se mantêm ainda
idênticas conclusões quanto à explicação dos perturbadores enigmas próprios à
investigação psíquica. Aqui vale acrescentar que, mesmo entre os investigadores
mais competentes na matéria, há ainda um grande número que se recusa a acolher
tais explicações, preferindo considerar o defeito de forma e conteúdo
observados em certas mensagens teoricamente importantes, como provas de que as
mensagens em questão não podem ser de origem espírita. Do mesmo modo,
aproveitam-se da circunstância de as formas materializadas se assemelharem por
vezes aos médiuns para acusá-los de fraude ou para, quando o controle é rigorosamente
mantido, declarar que a forma materializada é, em todos os casos, apenas o duplo do médium. É, pois, útil recordar
que desde os primeiros tempos do movimento espírita, as personalidades mediúnicas
se preocuparam em responder, em termos adequados e racionais, às dúvidas
teóricas engendradas pela maneira como se produziam certas manifestações
mediúnicas.
Observarei que os “espíritos-guias” do círculo de Koons obviamente
forneceram as explicações transcritas com a finalidade de justificar os
defeitos de diferente natureza que se encontravam em suas próprias mensagens,
nas quais os mais admiráveis ensinos de ordem moral, religiosa, científica e
filosófica eram muitas vezes formulados em termos defeituosos. Verifica-se
igualmente que os “espíritos-guias” tentaram, por várias vezes, explicar a
natureza e a razão de ser do elemento elétrico do universo, assim como a natureza
e a razão de ser do elemento magnético-vital nos organismos vivos, mas tiveram
que renunciar ao propósito porque o seu pensamento era transmitido imperfeitamente,
resultando as tentativas em um conjunto de frases desordenadas e indecifráveis,
ainda que certos pensamentos cá e acolá bastem para revelar a alta significação
científica que teria tido a mensagem se transmitida integralmente. Pelo
contrário, quando se trata de assuntos menos árduos à mentalidade humana, os
ensinos são formulados de modo mais feliz. É nesses últimos que se observa a
eloqüente concordância habitual com as conclusões às quais chegaram hoje vários
pesquisadores. Koons escreve o seguinte a esse respeito:
“Entre outras coisas, os espíritos ensinavam que o
“corpo carnal” é penetrado, em todas as suas moléculas, por um “corpo
espiritual”; que é nesse último que residem a consciência e a inteligência;
que, no momento da morte, a consciência e a inteligência, juntamente com o
“corpo espiritual”, se distanciam do “corpo carnal”; que o primeiro conserva
temporariamente a forma humana e as tendências e disposições que o caracterizavam
quando vivo. Em outras palavras, eles afirmavam que tanto o “corpo espiritual”
quanto o “Espírito” que o penetra, ainda que destinados a um progresso glorioso
e eterno, conservam, depois da morte, as tendências virtuosas ou viciosas de
que tinham dado provas durante a existência terrestre, o que faz com que o
“corpo espiritual” pareça grosseiro ou sutil, denso ou sublime, radioso como o
Sol ou tenebroso como a noite, em perfeita relação com as condições morais e
intelectuais nas quais se passou a existência terrena.”
No ponto de vista religioso, os “espíritos-guias”
ensinavam que um elemento de verdade existe em todas as religiões, que todas
essas são igualmente respeitáveis e necessárias porque cada uma se adapta ao
grau de evolução atingido pelo povo que a professa. Eles condenavam, pois, e
denunciavam asperamente a intolerância religiosa e toda espécie de dogmatismo
sectário. Foi esta uma das causas que atraíram para o círculo de Koons os
ressentimentos e as vinganças do clero. Os ministros das diferentes confissões
cristãs se puseram de acordo para caluniar e difamar Jonathan Koons e toda a
sua família, excitando, em seguida, contra ele, hordas de fanáticos. Koons viu
então a sua casa invadida por comissões criadas arbitrariamente e esses juízes
inquisidores tudo vasculharam, procurando descobrir as supostas fraudes, e
submetendo-o a interrogatórios humilhantes. Koons viu em seguida sua granja ser
incendiada, destruídas suas colheitas, insultados e ameaçados sua esposa e
filhos. Como se isso não fosse bastante, o comentário dos prodígios, produzidos
em sua casa, tendo-se largamente espalhado nos Estados Unidos, atraiu sobre o
infeliz as censuras e a cólera do misoneísmo laico, começando pelos jornalistas
e indo até aos sábios, fazendo todos o melhor por estigmatizar, com epítetos
infamantes, a família Koons, que, segundo se apregoava, subtraía dinheiro aos
imbecis e traficava com o mistério sagrado da morte. Tudo isso era dito e
exercido contra um homem que acolhera sempre generosamente, em sua casa,
hóspedes em grande número. Como a granja ficava perdida no meio do campo, ele,
de contínuo, alojara e alimentara gratuitamente todos os seus hóspedes, até o
dia em que, dois anos passados nesse sistema tão custoso de hospitalidade, se
encontrara desprovido de recursos para viver.
A esse respeito deve-se observar que Frank Podmore, que, como
se sabe, se obstinou durante toda a sua vida a reduzir a fenomenologia
mediúnica inteira a simples telepatia, atribuindo precipitadamente as manifestações
físicas e clarividentes, em massa, a fraudes dos médiuns (sem hesitar em
insinuar suspeitas de fraudes mesmo em relação à personalidade íntegra de William
Stainton Moses), deve-se observar, digo eu, que Podmore, quando chega, em sua
história do Modern Spiritualism, às
manifestações do círculo de Koons, dele fala apressadamente e passa, a seguir,
a outro assunto, sem fazer comentários e sem formular nenhuma insinuação contra
a honorabilidade desse infeliz que foi Koons. É difícil de ler essa passagem da
obra de Podmore sem experimentar surpresa. Parece incrível que o autor, apesar
de sua ausência de escrúpulos, não tenha chegado a imaginar alguma insinuação
de fraude capaz de sustentar-se em face da lógica. A coisa podia, aliás, ser
prevista a priori, pois que era impossível
infirmar as centenas de atas existentes, todas atestando a realidade dos
fenômenos em termos precisos, eficazes e concordantes, tornando impossível
explicar pela fraude as modalidades pelas quais se manifestavam os fenômenos.
Como explicar, com efeito, pela hipótese da fraude, o episódio das mãos
materializadas que se dissolviam nas mãos dos experimentadores? Como explicar o
fenômeno da “câmara espírita” que era abalada em suas bases como que por um
tremor de terra? Como explicar o fenômeno das pequenas chamas mediúnicas que
volitavam no ar, seguindo o ritmo da música? Como explicar o fenômeno da “voz
direta” no qual as personalidades dos defuntos conversavam com o timbre de voz
e o acento pessoal que tinham quando vivos, fornecendo detalhes verídicos e
íntimos sobre as suas vidas terrenas? Como explicar o fenômeno da “escrita
direta”, obtido em um lugar hermeticamente fechado e onde não havia ninguém,
graças ao qual se respondia a perguntas formuladas, no momento, do lado de
fora? Como explicar o fenômeno dos concertos de música em um quarto isolado no
jardim e que não se prestava à introdução de comparsas? Para doze instrumentos
de música, doze músicos são necessários; e de onde viriam eles? De onde viriam
os suaves cantores dos “coros angelicais” que emocionavam de tal modo os assistentes?
Segue-se de tudo isso que as manifestações do círculo de Koons
marcam uma data importante na história do Espiritismo moderno. O devotamento
com o qual Jonathan Koons se consagrou à propaganda da Verdade, olvidando os
seus interesses mais essenciais e se submetendo a um doloroso martírio moral e material, merece ser recompensado,
transmitindo-se à posteridade seu nome cercado da gratidão eterna dos
pesquisadores. O nome de Jonathan Koons tem, pois, direito a um lugar de destaque
na história da nova Ciência da Alma.
[i] Bozzano escrevia em 1925. (N. E.)
[ii] Bozzano denomina os espíritos comunicantes “personalità medianiche”. Em 1940 publicou uma monografia com o título Personalità medianiche che si dichiarano
Personalità subcoscienti. (N. E.)
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